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9 de janeiro de 2008

Novas suspeitas contra o bispo


O Bispo Edir Macedo, fundador e líder da Igreja Universal do Reino de Deus, enfrenta um processo em que é acusado de falsificar documentos para negociar duas emissoras de TV, retransmissoras da Rede Record em Santa Catarina. O autor da denúncia é o ex-pastor Marcelo Pires, antigo membro do grupo de confiança de Macedo. ÉPOCA teve acesso a um documento que pode complicar a defesa de Edir Macedo. Trata-se do laudo de um perito, cuja conclusão sugere que Macedo teria falsificado uma procuração usada na venda das emissoras. “O autor (Edir Macedo) tenta ardilosamente ludibriar o leitor”, afirma o autor do laudo, o perito Claus Guenter Rottschaefer, do Instituto de Criminalística do Estado do Paraná.

Fundada em 1977, por Edir Macedo, a Igreja Universal do Reino de Deus se tornou o terceiro maior grupo pentecostal do Brasil com uma estratégia ambiciosa, descrita na semana passada pela revista britânica The Economist como “igreja de resultados”: a atração de fiéis com a promessa de graças divinas em troca de contribuições financeiras. Por conta dessas contribuições, Macedo conseguiu montar um partido político, o Partido Republicano Brasileiro, e comprar a Rede Record de Televisão, hoje a segunda maior do país. No centro da disputa entre Edir Macedo e o ex-pastor Marcelo Pires está a prática da Universal de colocar suas emissoras de rádio e TV em nome de pastores e bispos, expediente usado para driblar uma lei que proíbe igrejas de ser donas de empresas de radiodifusão. O ex-pastor Marcelo Pires, que processa Macedo, trabalhou na Universal durante nove anos e deixou a igreja em 2000. Ele já teve pelo menos quatro empresas em seu nome, entre elas as duas emissoras de TV. Pires nega ter sido testa-de-ferro da Universal e afirma ser o verdadeiro dono das duas TVs de Santa Catarina – a TV Xanxerê e a TV Itajaí –, avaliadas em US$ 3 milhões.

A empresa que financiava a compra de TVs e rádios seria da própria Universal, afirmam ex-pastores

A Xanxerê foi inaugurada em 1991. A TV Vale do Itajaí, em 1986. Antes de entrar para a Rede Record, em 1996, ambas retransmitiam a programação da Rede CNT. As duas emissoras têm pouco mais de cem funcionários e ocupam áreas de cerca de 600 metros quadrados cada uma. Além de veicular a programação da Record, elas produzem seis programas locais.

A propriedade de ambas as emissoras foi transferida, em 2002, para o nome do presidente da TV Record, bispo Honorilton Gonçalves. A transferência foi feita com base numa procuração assinada por Marcelo Pires, delegando poderes a Edir Macedo sobre as duas emissoras. Pires afirma que Macedo falsificou essa procuração. Para provar isso, ele contratou o perito Rottschaefer e o incumbiu de investigar os indícios de fraude. Pires não contesta sua assinatura no final da procuração. Sua intenção é provar que ela foi assinada com trechos em branco.

De acordo com o laudo do perito Rottschaefer, quatro fortes indícios sustentam a tese:

1) o trecho com o nome das empresas que seriam vendidas foi acrescentado posteriormente, afirma o perito, e usa uma tipologia gráfica diferente do documento original (leia o quadro)

2) a Xanxerê, que se chamava RCE Xanxerê Ltda., passou a se chamar Televisão Xanxerê Ltda. em 1998. Mas a procuração, datada de 1996, já a chama pelo nome que surgiria dois anos depois. Em 1996, Pires nem era dono da emissora. Isso só ocorreria formalmente em 1998

3) Pires assinou o documento em 1996, mas a firma só foi reconhecida no cartório em 2003, sete anos depois

4) o trecho inicial da procuração cita “a empresa”, no singular. Mas o trecho em seguida lista três empresas, a Xanxerê, a TV Vale do Itajaí e a Rede Fênix de Comunicação, uma associação formada pelas duas emissoras.

A Polícia Federal investiga se houve mesmo falsificação ou se Pires era, na verdade, testa-de-ferro da Universal. Oficialmente, Pires comprou a participação nas TVs catarinenses com R$ 375 mil que tomou emprestados da Cremo Empreendimentos, uma empresa de São Paulo. Pastores que já se afastaram da Universal afirmam que a Cremo é uma empresa com um proprietário oculto: a própria Igreja Universal.

Um dos sócios da Cremo é o ex-deputado federal João Batista Ramos. Ramos teve um constrangedor momento de fama em julho de 2005. Ele viajava de Manaus para São Paulo num jatinho. Ao fazer uma escala em Brasília, policiais federais obrigaram-no a descer do jatinho, e ele foi detido com sete malas com R$ 10 milhões da Universal. Ramos ainda enfrenta hoje processos por lavagem de dinheiro, sonegação e crime contra a ordem tributária e o sistema financeiro.

Segundo ex-membros da Universal, a Cremo já financiou a compra de outras emissoras de TVs e rádios feita por pastores e bispos. Nessas operações, os membros da Universal tomam empréstimos da Cremo para comprar as emissoras. Quando se desligam da igreja, as emissoras são transferidas a outros religiosos, e a dívida com a Cremo é cancelada. Marcelo Pires afirma que sua história é diferente. Ele diz ser dono das cotas das TVs de Santa Catarina e afirma que o empréstimo que tomou da Cremo não foi de fachada.

Depois que Pires passou a exigir na Justiça a anulação da venda das TVs, a Cremo entrou com um pedido de execução de sua dívida, calculada hoje em R$ 1, 7 milhão. Num documento anexado ao processo de cobrança contra Pires, os advogados da Cremo cometeram um lapso que sugere a ligação entre a Cremo e a Universal: a advogada Tatiana Tiburcio refere-se à autora do processo como a Universal, não a Cremo.

O delegado da PF que apura o caso, Annibal Wust do Nascimento Gaia, disse que não poderia ainda falar sobre o resultado das investigações. A disputa pelas retransmissoras da Record talvez seja o primeiro capítulo de uma guerra que ainda pode envolver outro negócio da Igreja Universal. A gravadora Line Records, que vende 25 milhões de CDs evangélicos, também tem um sócio indesejado por Macedo: o mesmo Marcelo Pires.

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